Um novo olhar sobre a mineração – 2º Fórum Minas e Mineração no Século XXI
Tijolo, telha, ladrilho hidráulico, tinta, compensado plástico e até silício metálico para fabricação de ligas de alumínio para fundição podem ser feitos a partir de rejeitos e resíduos de minério. Dependendo das características do rejeito, essa aplicação pode ser ampliada e usada na agricultura. Esse aproveitamento e outros assuntos acerca da atividade de mineração foram discutidas durante o 2º Fórum Minas e Mineração no Século XXI, que aconteceu em 14 de setembro, na UFMG.
O desastre do rompimento da barragem em Bento Rodrigues, em novembro de 2015, provou que a atividade mineradora precisa ser repensada em todos os sentidos. Beatriz Luz, especialista em Sustentabilidade Estratégica e Economia Circular da plataforma de troca de conhecimento global Exchange4Change Brasil mostrou como os conceitos da economia circular podem ser aplicados à mineração. A especialista apresenta a possibilidade como uma forma de os consumidores serem vistos como usuários e os produtos como serviços. A discussão é pautada pelo risco de escassez no suprimento de matéria-prima e pelas novas tecnologias. “No caso na mineração não existe um produto final específico, trabalha-se direto com a extração da matéria-prima. Assim, é importante pensar na diferenciação do negócio, pois esse material é finito e, quando ele acabar, como o negócio vai continuar?”, pondera Beatriz.
Para estudar os fluxos da mineração de forma aprofundada, a Vale criou a ferramenta Roadmap Tecnológico, que propõe uma gestão de rejeitos que considere novas alternativas de usos e destinos. Para isso, foram consideradas algumas megatendências mundiais que impactam diretamente o setor: escassez de água, energia e alimento; menor disponibilidade de matéria-prima e redução da qualidade dos recursos minerais; falta de espaço para armazenagem de rejeitos em virtude do crescimento populacional, entre outros aspectos. “Com esse contexto, desenhamos possibilidades de nichos de mercado com base no curto, médio e longo prazos e pensamos nos recursos e competências que precisam ser desenvolvidos. Foram priorizadas as soluções de curto prazo que consideram aquele resíduo que pode ser usado da forma como está, sem necessidade de beneficiamento.”, explica Luciana Dinardi, Engenheira Master da Vale.
Vânia Lucia de Lima Andrade, da Associação Brasileira de Metalurgia, Materiais e Mineração participou do evento e acredita que é preciso repensar a mineração muito antes da geração do resíduo. “Se hoje são produzidas 100 milhões de toneladas de minério, também são geradas 100 milhões de toneladas de rejeito. Não podemos pensar apenas na pós-produção. A mineração precisa ser repensada desde o planejamento da mina”, opina Vânia.
A meta Resíduo Zero tem sido almejada por algumas empresas. Durante o Fórum, a Votorantim Metais apresentou a sua política de Resíduo Zero. A empresa alcançou a meta Zero Resíduo em sua mina de Morro Agudo, em Paracatu (MG), que é constituída de minerais sulfetados de zinco (esfalerita) e chumbo (galena). O principal resíduo produzido pela mina é o pó calcário. A empresa gera cerca de 880 mil toneladas de pó calcário por ano. Atualmente, 100% do pó calcário agrícola é comercializado para a indústria agropecuária, principalmente para utilização como corretivo de solo, que melhora a absorção de nutrientes e potencializa a produção agrícola. Para o pesquisador de Solos e Nutrição da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) João Herbert Moreira Viana, a iniciativa da Votorantim mostra que é possível aproveitar 100% do resíduo, mas é importante investir em novas pesquisas para que a solução seja pensada de acordo com as necessidades doe cada tipo de solo.
Metas e estratégias
De acordo com os especialistas presentes no Fórum, a possibilidade de aproveitar resíduos e rejeitos de minério é real, o desafio está em como fazer isso em escala industrial que seja economicamente viável. José Flávio Nascimento, do Departamento de Estradas e Rodagens (DER) mostrou que é possível usar esse material em terraplanagem, drenagem, conservação e pavimentação de estradas. “Somos consumidores potenciais desse resíduo. O preço, condições de transporte, custo da execução e questões relativas ao licenciamento ambiental serão determinantes para isso”, afirma.
A necessidade de legislação e regulação que assegure o aproveitamento dessa matéria-prima foi outra lacuna apontada pelos participantes como prioritária. Fernando Lameiras, pesquisador do CDTN, cita como o uso do ladrilho hidráulico feito com resíduos da mineração poderia ser estimulado. “Hoje, é obrigatório o uso de ladrilho hidráulico nas calçadas de Belo Horizonte. Esse material pode ser feito com 50% de resíduo. Uma legislação que garanta que esse processo seja feito seria um bom incentivo”, acredita.
As tendências do mercado da construção civil representam outra barreira que precisa ser transposta. A cor de um tijolo ou de uma tinta feita com resíduo ainda não é algo aceito e disseminado, é preciso trabalhar nesse sentido para mostrar que esse material não é inferior em relação à qualidade. Essas e outras discussões ainda precisam ser debatidas e a Plataforma R3 Mineral se apresenta como um espaço de articulação permanente entre todos os envolvidos.
Fonte: Fapemig